“O fogo é assim, um fenômeno privilegiado capaz de explicar tudo. Se tudo o que muda lentamente se explica pela vida, tudo o que muda velozmente se explica pelo fogo”. (Gaston Bachelard).
Enio Fonseca
Em boa parte do País, neste período seco que vivemos, estamos assistindo, infelizmente, a um volume jamais visto de queimadas e incêndios florestais, não só na Amazônia, quanto no Pantanal, e no bioma do cerrado, que causam prejuízos enormes, angústia, perplexidade e revolta generalizada.
Sou especialista em Prevenção e combate a incêndios florestais, num curso que fiz no Chile em 1985, tendo ajudado a criar a legislação afeta a este tema, e a implantar os sistemas de prevenção e controle a nível federal (Conacif e Prevfogo coordenados pelo IBAMA), como no Estado de Minas Gerais que tem o Previncendio, coordenado pelo IEF,
O agravamento da temporada de incêndios na Amazônia, no Pantanal e no Cerrado está causando episódios de fumaça e considerável degradação da qualidade do ar em cidades de dez estados brasileiros. O Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos tem divulgado imagens que evidenciam uma alarmante concentração de monóxido de carbono se estendendo do Norte do Brasil até as regiões Sul e Sudeste, atingindo também países adjacentes como Peru, Bolívia e Paraguai.
Em face desta crise, o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância (Unicef) divulgou um aviso na semana passada sobre as medidas necessárias para salvaguardar a saúde do público, particularmente as crianças.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), os focos de incêndio na Amazônia estão concentrados principalmente no sul do Amazonas e ao longo da Rodovia Transamazônica (BR-230). Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicam que Amazonas e Pará são responsáveis por mais da metade (51,6%) dos focos de incêndio registrados no bioma entre 1º de janeiro e 18 de agosto de 2024. Desde 1º de julho, esses dois estados registraram 67,2% dos focos de incêndio no bioma.
O Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa-UFRJ) relatou que, neste ano, os incêndios já destruíram 3,2 milhões de hectares da Amazônia, o que representa 0,77% do bioma. No Pantanal, o fogo consumiu quase 1,9 milhão de hectares, afetando 12,5% do território.
O Sistema de Alarmes do Lasa-UFRJ emitiu um alerta de perigo extremo de incêndio, prevendo condições climáticas altamente desfavoráveis para o combate aos incêndios na Bacia do Paraguai, no Pantanal, até este final do mês de agosto. As condições indicam uma alta velocidade de propagação do fogo, o que dificulta ainda mais o combate, inclusive por meio de operações aéreas.
Para enfrentar a crise, o MMA informou que 1.489 brigadistas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) estão atuando no combate aos incêndios na Amazônia. Desde 24 de julho, 98 incêndios foram extintos, mas 75 ainda permanecem ativos, reunindo até milhares de focos de calor.
No Pantanal localizado em Mato Grosso, atualmente há 348 brigadistas do Ibama e ICMBio atuando no terreno, juntamente com 454 militares das Forças Armadas, 95 membros da Força Nacional e 10 da Polícia Federal. De todas as 98 zonas de incêndio detectadas, 50 já foram controladas, porém 46 permanecem ativas, sendo que 27 já se encontram sob controle.
Em resposta à emergência, o governo federal criou uma sala de situação em junho para coordenar as ações de combate aos incêndios em todo o país. Na Amazônia Legal, foram disponibilizados R$ 405 milhões do Fundo Amazônia para apoiar as operações do Corpo de Bombeiros estaduais. No Pantanal, foi liberado um crédito extraordinário de R$ 137,6 milhões, além de um repasse de R$ 13,4 milhões ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional para assistência humanitária e combate aos incêndios florestais.
Dois dos principais biomas brasileiros quebraram recordes históricos de queimadas no primeiro semestre de 2024. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Cerrado e o Pantanal sofreram a maior quantidade de focos de incêndio registrados desde 1988, quando o instituto deu início ao monitoramento.
No período, a Amazônia também registrou o maior número de focos de incêndio em 20 anos. A exceção, de acordo com o Inpe, são os Pampas, no Sul, região castigada por fortes chuvas nos primeiros seis meses do ano.
Os satélites de monitoramento registraram, no Pantanal, 3.262 focos de queimadas entre 1º de janeiro e 23 de junho. A marca é 22 vezes maior do que os registros do mesmo período em 2023. Já no Cerrado, foram detectados 12.097 pontos de incêndio, 32% a mais que o registrado no ano passado.
No Pantanal, a crise superou a marca negativa de 2020, até então a mais severa, quando foram registrados 2.534 focos entre 1º de janeiro e 30 de junho. Na ocasião, o fogo devastou um terço da área do bioma, e especialistas estimam que 17 milhões de animais vertebrados morreram nos incêndios.
O aumento das queimadas em 2024, de acordo com especialistas, está ligado principalmente à crise climática. O Pantanal, por exemplo, vive seca hídrica severa. Chuvas escassas no começo do ano foram insuficientes para transbordar rios e conectar lagoas e o Rio Paraguai, o principal do bioma, que atingiu níveis baixos para o período. Também a região amazônica sofre com a estiagem severa.
As queimadas no Norte têm ligação com o desmatamento, uma vez que o fogo é usado para ‘limpar’ áreas florestais derrubadas. O aumento de incêndios também está associado às secas históricas que atingiram o bioma em 2023, devendo a população ter em mente, que independente das condições adversas o homem é o maior causador das queimadas que muitas vezes viram incêndios florestais
Importante salientar que as atividades agrícolas de ponta realizadas em nosso País, não se valem de técnicas arcaicas como o uso do fogo, seja para manejo de pastagens ou de culturas como a cana. Ao contrário, os incêndios quando ocorrem nas propriedades vinculadas ao agronegócio, trazem prejuízos econômicos de toda ordem, havendo inclusive registros de morte de animais e seres humanos, tendo estes setores estruturas de prevenção e combate a estes eventos.
A prevenção é a melhor estratégia para enfrentar as queimadas e os incêndios florestais.
Campanhas educativas devem ser feitas durante todo o ano, com a participação de todos os interessados, setor florestal, órgãos florestais, ONGs, Corpo de Bombeiros, proprietários de áreas rurais, como empresas do setor , agropecuário e mineral, sendo uma referencia a iniciativa educativa e de comunicação da ONG Zeladoria do Planeta, “Não deixe o fogo apagar a vida”.
Fui co-autor de 2 manuais de Prevenção e Controle de Incêndios Florestais, feitos em parceria entre a Cemig e o Deptº de Engenharia Florestal da UFV, sendo que o mais recente poderá ser acessado pelo link abaixo.
Enio Fonseca
CEO da Pack of Wolves Assessoria Socioambiental, foi Superintendente do Ibama, Conselheiro do Copam MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, foi Gestor de sustentabilidade da Associação Mineradores de Ferro do Brasil (AMF). Diretor de Responsabilidade Social e Ambiental da ALAGRO.Profissional Senior em Gestao Ambiental, membro do Conselho Editorial e colunista do Canal Synergia.