No Brasil, cientistas do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-CNEN) desenvolveram a primeira bateria nuclear nacional, a partir de um isótopo em decomposição de amerício (amerício-241). Sem precisar de uma recarga extra, ela pode fornecer energia para aparelhos por mais de 200 anos.
A pesquisa brasileira desenvolveu uma bateria nuclear termoelétrica, também conhecida como gerador termoelétrico radioisotópico (RTG). A produção de eletricidade é feita a partir do calor e não envolve fissão nuclear – este seria o caso de uma bateria termonuclear.
Buscando entender as etapas de desenvolvimento e quando poderemos usar as baterias nucleares – que colocam um fim nos carregadores -, o Canaltech conversou com Maria Alice Morato Ribeiro, pesquisadora do Centro de Engenharia Nuclear do IPEN e coordenadora do projeto.
Como funciona a bateria nuclear?
Antes de explicarmos, vale definir o que é o amerício. Trata-se de um metal radioativo, relativamente maleável e de coloração prateada, cujo símbolo na tabela periódica é Am. Ele é um emissor de partículas alfa e gama, com atividade de partículas alfa aproximadamente três vezes maior que a do rádio. O elemento possui 10 isótopos conhecidos pela ciência.
Na bateria nuclear, o calor de decaimento natural do radioisótopo é que vai gerar energia elétrica. Como parte do processo, esse calor precisa passar através de pastilhas termoelétricas geradoras de energia elétrica (TEGs).
Por enquanto, a tensão de saída nas pastilhas termoelétricas é de 20 milivolts (mV). Isso é resultado da diferença de temperatura nas pastilhas termoelétricas entre a fonte de Amerício (lado quente) e a parte externa (lado frio).
Essa tensão alimenta um circuito coletor que acumula energia suficiente e assim fornece pequenas cargas, periodicamente. No entanto, como o atual modelo possui uma capacidade muito baixa de geração de energia, é necessária uma fonte com atividade maior apenas para acender um LED.
O que é impressionante na bateria é o tempo de duração, estimado em 200 anos, devido à meia-vida do amerício ser de 432,6 anos. No entanto, “ainda enfrentamos desafios técnicos relacionados à confiabilidade das pastilhas termoelétricas, as quais precisam operar por um período equivalente”, destaca Ribeiro.
Por isso, a cientista conta que esta primeira bateria foi desenvolvida, na verdade, para validar o conceito. O próximo passo é construir uma versão melhorada, com potência de 100 mW.
Onde usar uma bateria nuclear?
Hoje, as baterias nucleares já são usadas em locais de difícil acesso. São os casos de faróis em ilhas desertas e dispositivos enviados para o espaço, como satélites. Os rovers da NASA também usam esse tipo de tecnologia, como o Curiosity e o Perseverance.
Recentemente, uma startup chinesa anunciou o desenvolvimento de baterias para alimentar dispositivos de uso pessoal, como celulares, drones e computadores.
No caso da bateria brasileira, a ideia é usá-la para em dispositivos instalados em locais remotos. No entanto, a cientista ainda não pode entrar em detalhes sobre esses planos por questões de confidencialidade envolvendo os parceiros.
Bateria nuclear oferece riscos?
Pensar em algo nuclear logo remete a sérios riscos para à saúde humana e ao meio ambiente, mas existem inúmeras proteções. Por exemplo, “o uso de blindagens eficientes” garante a segurança, como afirma Ribeiro. Além disso, “o radioisótopo está contido em fonte selada, não havendo perigo de dispersão do material”, acrescenta.
Curiosamente, ela lembra que, na década de 1970, as baterias nucleares, como as de plutônio-238 e promécio-147, eram amplamente usadas em marca-passos de pacientes com problemas no coração. O uso só foi descontinuado com a ascensão das baterias de lítio.
Reciclagem de resíduos radioativos
Outro ponto interessante envolvendo essas baterias é que elas podem ser criadas a partir da reciclagem dos radioisótopos encontrados nos combustíveis (já usados) provenientes de reatores nucleares de usinas, incluindo o amerício-241.
FONTE: Canaltech via IPEN